As classes de
palavras
Indo mais
além
Preciso iniciar este texto destacando que o ensino
de gramática na escola, normalmente, parecerá enfadonho e despropositado ao
estudante muito em função da falta de percepção pelo professor de que a
gramática não pode ser desvinculada do uso da língua. A inconveniência na
separação entre gramática e uso da língua e as desvantagens pedagógicas dela
decorrentes já foram exaustivamente discutidas pelos mais variados e renomados
especialistas em linguística; não pretendo, pois, me ocupar dessa questão aqui.
Intento tão-só deixar claro que o tratamento que dispensarei, aqui, às classes
de palavras deve, nas aulas de português na escola, ser articulado a atividades
que considerem a língua em funcionamento em textos. Disso não se segue a
utilização de textos como pretexto para realização de análise sintática ou
identificação da classe gramatical das palavras. Na verdade, na medida em que
se estuda a gramática numa concepção de língua como lugar de interação, procura-se estudar o comportamento
semântico-pragmático das unidades linguísticas. Vejamos um exemplo disso.
Costuma-se
ensinar ao aluno que as formas felizmente,
infelizmente, certamente e talvez são
advérbios. As duas primeiras formas são consideradas – um pouco confusamente –
advérbios de modo; a terceira, advérbio de afirmação;
e a quarta, advérbio de dúvida.
Estranhamente, a mesma tradição gramatical que considera “talvez” um advérbio
de dúvida, para o que recorre à semântica da palavra, não classifica
“certamente” como advérbio de certeza, o que seria mais coerente. O leitor logo
verá que, à luz de uma abordagem do comportamento discursivo da forma
“certamente”, a classificação semântica tradicional se demonstra inadequada.
“Certamente”, de fato, expressa uma atitude de certeza. Consideremos as
seguintes frases. Lembro, contudo, que o estudo deste e de outros tantos fatos
linguísticos deve ser feito em textos empiricamente representativos e não em
frases isoladas. Todo texto produz contexto. É sobre o contexto que as
atividades em sala de aula devem se apoiar.
(1) Felizmente,
ninguém saiu gravemente ferido.
(2) Infelizmente,
eu não consegui chegar a tempo para assistir ao espetáculo.
(3) Talvez,
ele esteja preso num engarrafamento.
(4) Certamente,
eles brigaram.
Se o
objetivo do ensino de português é o desenvolvimento da competência comunicativa
dos aprendizes, improfícua será a atividade em que eles são solicitados a
simplesmente identificar e classificar semanticamente os advérbios que figuram
nas frases acima. Uma vez traçado o objetivo referido, o método empregado, como
se vê, é inadequado. No máximo, o aluno poderá sair da escola (e isto nem
sempre acontece) sabendo o que é um advérbio, como identificá-lo e
classificá-lo.
O
professor poderá, todavia, estando familiarizado com os estudos da Linguística
textual e do funcionalismo produzido por especialistas como Maria Helena de
Moura Neves, fomentar uma reflexão sobre a função discursiva dessas unidades. Note-se
que o olhar sobre o fenômeno linguístico em tela muda. Não se levará mais em
consideração apenas o comportamento sintático-semântico dessas formas, mas
especialmente o comportamento discursivo, funcional delas. Vejamos como isso
acontece:
1) Na
perspectiva morfossintático-semântica no domínio frásico:
- O
professor ensina ao aluno que os advérbios exprimem circunstâncias da ação
verbal (aspecto semântico);
- O
professor mostra ao aluno que muitos advérbios apresentam a terminação –mente, destacando que, em geral, os que
admitem a forma “-mente” são os advérbios de modo (aspecto morfológico);
- O
professor chama atenção para o fato de que os advérbios são invariáveis
(aspecto morfológico);
- O
professor pode também chamar a atenção para a relativa mobilidade dos
advérbios, especialmente, os terminados em “-mente” (aspecto sintático);
- O
professor destaca que os advérbios modificam adjetivos, verbos e outros
advérbios (aspecto sintático-semântico).
2) na
perspectiva discursiva, no domínio textual:
-
Agora, o professor ensinará que os advérbios informam alguma coisa sobre os
pontos de vista, as atitudes e sentimentos do falante;
-
Ensinará ainda que alguns advérbios incidem semanticamente sobre todo o
enunciado;
- Que
eles cumprem um papel na orientação argumentativa do discurso;
- Que a
escolha entre uma forma e outra, para efeito de uso, não é aleatória, mas
determinada pela intenção comunicativa do falante;
-
Ensinará ainda que essas escolhas produzem sentidos diversos;
- E
ainda que o sucesso comunicativo depende de que as escolhas feitas sejam
adequadas aos propósitos comunicativos do falante e à situação de comunicação.
Consideremos
as frases de (1) a (4), doravante, a fim de que possamos entender de que modo
podem ser contempladas as formas em destaque numa perspectiva discursiva.
Em (1),
acha-se o advérbio “felizmente”. Suponhamos que a frase (1) tenha sido
produzida por alguém que assistiu no noticiário a um acidente que envolveu dois
carros. Ao usar “felizmente”, o enunciador deixa sua marca no próprio
enunciado. Ele projeta uma atitude de satisfação ou contentamento sobre o fato
comunicado. Quem o ouvisse dizer (1) certamente concordaria com ele. Se, no
entanto, tivesse escolhido “infelizmente”, muito provavelmente, atrairia para
si comentários de reprovação. Na literatura especializada, formas como
“felizmente”, “infelizmente”, “ainda bem”, “que bom”, etc. são chamadas de indicadores atitudinais.
Pedagogicamente, memorizar a nomenclatura não importa; o que importa, na
verdade, é compreender a função discursiva dessas formas, ou seja, o que
fazemos quando as usamos. A língua é forma de inter-ação, de ação social. Numa
perspectiva funcionalista da linguagem, o professor deverá orientar suas aulas
trabalhando questões que dizem respeito aos propósitos comunicativos que
subjazem às nossas escolhas linguísticas. A pergunta “o que faz o usuário da
língua ao escolher usar uma ou outra forma?” é que deve nortear as atividades
no ensino de língua portuguesa.
Em (2),
se topa a forma “infelizmente”. Seu uso é adequado, na medida em que, dessa
vez, o usuário da língua expressa, com ela, sua insatisfação em relação ao fato
de não ter conseguido cumprir com o combinado. Tal como “felizmente”, a forma
“infelizmente” é um indicador atitudinal.
(3) e
(4) podem ser tratados em conjunto, já que ambos apresentam comportamento
linguístico semelhante. Trata-se de modalizadores.
Modalizar um enunciado é marcar
linguísticamente o grau de adesão do enunciador ao seu próprio enunciado. A
adesão pode ser considerada em termos das modalidades, que remontam às
especulações de Aristóteles, ‘possibilidade’ e ‘necessidade’, às quais se
somam, por negação, as da ‘impossibilidade’ e ‘contingência’. Outras mais
modalidades foram propostas ao longo do tempo, de tal modo que o conjunto pode
incluir ainda as modalidades de ‘obrigação’ (deôntica, referente ao ‘dever’),
‘permissão’, ‘epistêmica’ (referente à crença/conhecimento), a de ‘desejo’, as
de ‘avaliação/julgamento’. Por exemplo, quem diz “Eu acredito que ele se
separou da mulher” expressa, pelo uso do verbo ‘acreditar’, ou melhor, pelo uso
da construção modalizadora ‘eu acredito que’ possuir uma crença no valor de
verdade da situação descrita. Ele possui uma crença, mas não um conhecimento,
de fato. O grau de adesão ao valor de verdade de seu enunciado, ou seja, a
forma como o enunciador se compromete com o que afirma é mais frouxa do que
seria caso dissesse “Eu sei que ele se separou da mulher”.
O
estudo desse capítulo da grande diversidade dos usos da língua pode ser
bastante interessante, já que o uso adequado de tais expressões serve, entre
outras coisas, para preservar nossa face positiva. Isto é, serve para garantir
que nossa imagem social que desejamos seja aprovada continue sendo bem
avaliada. Quem não disponha de evidências para afirmar “Eu sei que ele se
separou da mulher” deve evitar o uso do verbo “saber”, já que ele implica o
falante numa relação de compromisso com a verdade da situação comunicada. Se,
por ventura, se descobrir que não houve separação, o enunciador poderá ser
tachado de mentiroso ou tendencioso. Quem diz “eu sei que x se deu” põe sua
face positiva (imagem de si socialmente construída que se deseja aprovada) à
prova. Caso se verifique que realmente se deu o caso, o enunciador atrairá para
si prestígio, uma boa avaliação como detentor de um saber, gozará de mais
credibilidade entre seus amigos. Se se der o contrário, levantará suspeitas
contra si.
Em (3),
o enunciador, ao optar pelo uso de ‘talvez’, projeta sobre o seu enunciado uma
atitude de dúvida, de incerteza em relação à verdade do acontecimento. Assim,
ele não se compromete, ele não assume estar com a razão. Ao usar “talvez”, ele
sinaliza ao seu interlocutor que, caso se venha a saber que a pessoa de quem
fala se atrasou por outro motivo (dormiu demais e acordou tarde), não poderá
ser avaliado como alguém que faltou com a verdade, como alguém que pretendia
deter um saber. Na verdade, ele marca linguísticamente, com o uso de “talvez”,
sua atitude de incerteza. Ele levanta uma hipótese, baseado, possivelmente, em
seu conhecimento sobre as condições normais do trânsito naquele horário em sua
cidade. Desse modo, usando “talvez”, ele busca preservar sua face positiva.
O uso
dos modalizadores se demonstra, particularmente, importante quando escrevemos
textos dissertativos-argumentativos. Pesquisadores, cientistas em
universidades, bem como jornalistas em seus jornais, ao produzir seus textos
(artigos científicos, dissertações, ensaios, teses, artigos de opinião) precisam
saber usar adequadamente as formas modalizadoras. Assim, um cientista que
desconhece as causas de um fenômeno deverá evitar ser categórico. Deve
limitar-se a conjecturar, usando formas como “é provável que”, “possivelmente”,
“parece que”, “acredito que”, etc. Dessa competência depende o grau de
credibilidade de seu estudo e o modo como sua imagem de cientista será
avaliada.
Vamos
voltar às classes de palavras. Considerarei três delas aqui: o substantivo, o
adjetivo e o advérbio. Deste último já tratei um pouco, mas gostaria de tecer
algumas considerações sobre essa classe que não são, em geral, levadas em conta
pelo professor em sala de aula.
Tradicionalmente,
aprendemos que o substantivo é a classe de palavras que designam os seres e
coisas em geral. Designar dados de
nossas experiências de mundo é a função semântica do substantivo. O adjetivo,
por sua vez, é a classe de palavras que qualificam, caracterizam os seres
designados pelo substantivo. Às vezes, o professor diz que o adjetivo “modifica
o substantivo”. Embora nem sempre esclareça o que quer dizer com isso, o que o
professor quer dizer é que o adjetivo acrescenta
um ingrediente semântico (significativo) ao significado do substantivo.
Assim, em “menino estudioso”, temos o significado de ‘menino’ – ‘criança do
sexo masculino’ – ao qual acrescentamos outro significado, expresso por
‘estudioso’ – ‘que é aplicado nos estudos’. Assim, “menino estudioso” significa
“criança do sexo masculino que se aplica muito nos estudos”. O significado de
“menino” se modifica, de certo modo, portanto. Vimos que o advérbio é a classe
de palavra que designa circunstâncias da ação verbal. Essa definição, de base
semântica, recobre os casos em que o advérbio modifica o verbo, mas não se
aplica satisfatoriamente aos casos em que ele se prende a adjetivos e a outros advérbios.
Melhor será dizer, portanto, que o advérbio é um modificador do verbo, do
adjetivo e de certos advérbios. É razoável dizer que o advérbio se comporta à
semelhança de um adjetivo, já que também modifica o significado das palavras a
que se refere. Se digo “comi muito”, o advérbio “muito”, também chamado de advérbio quantitativo, comunica que
comi uma grande quantidade de alimentos. Tradicionalmente, “muito” é entendido
como advérbio de intensidade, visão esta adequada quando usado com adjetivos
(cf. Ela é muito bonita).
Até
aqui, definimos as três classes de palavras de um ponto de vista semântico,
visto que consideramos aspectos significativos de sua natureza. Há, entretanto,
dois outros critérios, pelos quais podemos considerar as classes de palavras, a
saber, o morfológico e o sintático. Considerados em conjunto,
podemos chamá-los de critérios morfossintáticos.
Vou, contudo, mantê-los separados, a fim de que compreendamos sua natureza e
vantagens (e desvantagens), para efeito de compreensão das classes de palavras
que submetemos à reflexão.
Tomemos
o substantivo. Do ponto de vista morfológico, sabemos que os substantivos são,
em geral, passíveis de flexão de número e gênero. Por exemplo, “menino”, “menina”, “meninos”, “meninas”. Mas isso
não nos ajuda muito, se quisermos distingui-los dos adjetivos, já que estes
também podem flexionar-se em gênero e número (cf. áspero/ ásperos/ áspera/
ásperas). Notemos, contudo, que os substantivos se prestam muito facilmente à
anexação de sufixos como “-inho”, “-zinho”, “-ão”. Vejam-se “menininho” e
“meninão”. Logo se verá que nem todos os substantivos se prestam ao acréscimo
de tais sufixos. Com alguns, o resultado é bastante estranho. Veja-se, por
exemplo, “conteudão” ou “conteudinho”, referentes a “conteúdo”. Também esse
critério pode não ser suficiente para definir de modo cabal o substantivo, dado
que também alguns adjetivos admitem o uso de morfemas desse tipo. É o caso de
“bonitinho” e “bonitão”, sem contar com a possibilidade de um advérbio como
“cedo” também apresentar-se na forma “cedinho”.
Há,
contudo, um sufixo, muito largamente usado, que é específico do adjetivo, já
que ele é responsável por formar adjetivos a partir de bases substantivas.
Trata-se do sufixo “-oso”. Citem-se
as formas “gostoso” (de gosto), “saboroso” (de sabor), “bondoso” (de bondade),
“amoroso” (de amor), etc. Assim, podemos definir os adjetivos como a classe de
palavras cujos membros admitem o acréscimo do sufixo “–oso”. Uma característica
importante do sufixo “-oso” é que ele se agrega tão-só a substantivos abstratos
que designam estado ou qualidade. “-Oso” não se acresce a substantivos
concretos, por exemplo. Não formamos de “menino” “meninoso”, nem de “casa”
“casoso”. Pode parecer desnecessário alertar para este fato, já que faz parte
da competência linguística do falante nativo não produzir tais formas ou
estranhá-las, se, por ventura, de brincadeira, alguém as produzisse. Mas não é
claro ao falante nativo o porquê dessas formações não serem gramaticalmente
possíveis. É papel do linguista, com base em hipóteses teóricas que deverão ser
corroboradas ou rejeitadas pela observação dos fatos, explicitar o conhecimento
linguístico internalizado e não-reflexivo (diz-se intuitivo) que o falante
nativo tem de sua língua materna.
Continuemos
a considerar o adjetivo. Outro critério seguro com que podemos definir o
adjetivo repousa na observação de que os adjetivos, em geral, admitem o
acréscimo do sufixo “-mente”. Vejam-se, por exemplo, “formidavelmente”,
“gostosamente”, “felizmente”, etc. Substantivos não admitem a combinação com
“-mente”. Também os adjetivos são usados sistematicamente com os sufixos
superlativos como “-íssimo”, nas variedades escritas muito formais (cf.
belíssimo, agradabilíssimo). Em algumas variedades faladas coloquiais, encontramos
o sufixo “-ésimo” (p. ex., “bonitésimo”, “lindésimo”, “gatésimo”)
Não
podemos, no entanto, nos contentar em definir as classes de palavras com base
em um critério apenas. Na verdade, tradicionalmente, os critérios semântico,
morfológico e sintático concorrem para a definição de todas as classes de
palavras. Sucede, contudo, que esses critérios são misturados e nem sempre
claramente definidos. Doravante, vou considerar o critério sintático.
Sintaticamente,
é muito difícil (para não dizer impossível) distinguir um substantivo de um
adjetivo, visto que, comumente, eles aparecem juntos num mesmo sintagma. Casos
há em que apenas a ordem em que aparecem é que permite distingui-los. Como, em
português, ao contrário do que sucede no inglês, o adjetivo se pospõe ao
substantivo (o que não impede que possa aparecer antes deste), é justamente o
fato de se colocar depois do substantivo que permite a sua identificação.
Veja-se os casos de “o velho negro” e “o negro velho”. Em “o
velho negro”, é “negro” que funciona como adjetivo; já em “o negro velho”, é
“velho” que se considera adjetivo. Ignoremos, por ora, o aspecto semântico. É
claro que a ordem produz sentido diferente. Mas quero destacar o fato de que o
adjetivo é sempre a forma disposta à direita, após o substantivo. E como
sabemos que a unidade depois do “o” é um substantivo? É que o artigo se
caracteriza por “substantivar” qualquer palavra à qual podemos antepô-lo. Por
exemplo, em “O bem sempre vence o mal nos filmes”, “bem”, que, em outro
ambiente sintático, se comporta como “advérbio de modo”, colocando-se depois de
“o” torna-se um substantivo, podendo funcionar como “sujeito” da oração.
Semanticamente, o artigo transpõe a função de designação a uma forma que, de
outro modo, é carecida dela. Platão, por exemplo, ensinávamos sobre o Bem (com
maiúscula), dando à palavra um conteúdo referencial, abstrato, decerto, mas Bem
passava a designar, muitas vezes, identificando-se a Deus. Também “o mal” passa
a designar as forças malignas ou aqueles que perpetram a maldade.
Podemos
acrescentar à definição do substantivo um aspecto importante: o fato de ser acompanhado de artigo.
Portanto, é substantivo toda palavra à qual podemos antepor um artigo ou
palavra de igual valor (caso de certos pronomes).
Também
o adjetivo pode ser definido sintaticamente, não considerando sua relação com o
substantivo, com o qual guarda muitas semelhanças, mas com o advérbio.
Adjetivos são as palavras que se deixam modificar por um advérbio como “tão”.. Por exemplo, “Ele é tão bonito”, “Ela é tão estudiosa”, “Nós somos tão competentes”, “Seus beijos
são tão doces”.
Finalmente,
no tocante ao advérbio, é preciso atentar para o fato de que ele se articula a
verbo, adjetivo e a outro advérbio. A possibilidade de combinar-se com outro
advérbio é suficiente para nos acautelar quando da consideração da classe da
palavra que aparecer junto a “tão”. É que “tão” pode também modificar um
advérbio. Veja-se, por exemplo, a frase “Hoje acordei tão cedo”, em que “tão”
modifica “cedo”, que é advérbio.
Não precisamos,
no entanto, desistir da compreensão do comportamento gramatical das classes de
palavras. Uma lição básica, de que não podemos nos esquecer, é que as palavras não tem distribuição sintática
aleatória, ou seja, elas não se colocam em qualquer lugar e não se
relacionam com qualquer outra palavra. Por exemplo, “cedo” aparece junto de
verbo e semanticamente se vincula ao verbo e não ao substantivo ou adjetivo.
Uma frase como “O menino cedo que eu conheci acabou de sair” é
inaceitável. No lugar de “cedo”, caberia uma forma como “esperto”, cujo uso é
adequado àquela posição. Por outro lado, podemos usar “cedo” junto a um verbo,
como em “O menino que eu conheci saiu cedo”. Em “Hoje acordei tão cedo”,
“cedo” se prende ao verbo “acordar” (acordei cedo). Quando a distribuição
sintática se nos demonstra pouco satisfatória, contamos com aspectos
morfológicos. Por exemplo, em “Ana anda cansada”, embora “cansada” se disponha
após o verbo “andar”, trata-se de um adjetivo que predica sobre o substantivo
“Ana”. Nesse caso, devemos prestar atenção ao fato de a forma “cansada”
apresentar-se na forma feminina, concordando com o substantivo feminino que
ocupa a posição de sujeito. Eu poderia estender minhas explicações, mas isso
extrapolaria os objetivos deste texto.