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terça-feira, 26 de outubro de 2021

"Devemos aprender durante toda a vida, sem imaginar que a sabedoria vem com a velhice". (Platão)

 




                                                                  SOBRE A MATURIDADE

 

 

A filosofia jamais se curva em face da petulância da estupidez, da arrogância dos corpos moldados por uma raiva crônica alimentada pela incapacidade de profunda compreensão. Tais corpos , jactantes, vociferam: “não vês que trago a marca do acúmulo de experiências!”. Pois bem. E também ostenta o estigma de inúmeros preconceitos, a marca crostosa da rigidez espiritual, da dureza da sensibilidade que os impede de ver o mundo com outros óculos, com lentes mais bem ajustadas às diferenças, à tolerância, à pluralidade de modos de ser e viver. O envelhecimento não nos torna, necessariamente, mais sábios, se, durante grande parte da vida, nos habituamos a servir aos mecanismos de fabricação social de indivíduos assujeitados. Se um corpo vital chega à maturidade desconhecendo que toda a sua existência social é fabricada para atender aos interesses da sociedade em que se desenvolveu, se ignora que, enquanto ser humano, ele se engana ao se pensar como sujeito autônomo, se ignora que ser sujeito é sempre existir como efeito de submissão a relações sociais que sistematicamente o produz como sujeito em processos ideológicos de assujeitamento - assujeitamento aos poderes instituídos, assujeitamento às normas sociais, às morais, aos discursos, aos valores; enfim, se ignora que ser sujeito é constituir-se na linguagem, nas relações com o outro, fora das quais não há um “eu” - então o envelhecimento não lhe legou nenhum grande benefício de que deva se orgulhar. A velhice apenas lhe acentua as marcas da decrepitude, da degeneração orgânica e assinala a proximidade do fim de uma vida medíocre e flagelada pela servidão social, pela escravidão aos mecanismos sociopolíticos de dominação. Como ensinou Sêneca, no século I EC., aquele que viveu 100 anos pode ter tido uma vida breve, se a viveu sem exercitar o cuidado de si, se a viveu sob o modo do desperdício. E aquele que se ocupou de si, mesmo tendo morrido aos 30 anos, viveu uma vida longa e plena.

quinta-feira, 16 de maio de 2019

"Viveste como se fosses viver para sempre, nunca te ocorreu a tua fragilidade" (Sêneca)


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                        A filosofia como prática de cuidado de si


1. A filosofia como exercício espiritual

Este texto, mesmo antes de o investir dos recursos linguísticos necessários à sua expressão, se me afigurou indispensável ao pleno desenvolvimento de minha vida intelectual. Ele encontra sua origem e razão de ser em minhas vivências ordinárias, particularmente em meus breves e passageiros contatos com homens e mulheres que, cotidianamente, tomando o trem, reproduzem a condição de homens-massa. São esses, em especial, os leitores potenciais deste texto. A condição de leitores potenciais não significa que eu presuma que eles lerão o texto, mas apenas demarca um horizonte de interlocução imaginária, suposta por toda produção textual escrita.
Mas o que pretendo eu ao escrever este texto? Pretendo retomar a discussão sobre o valor da filosofia como uma maneira de viver intimamente vinculada ao discurso filosófico. Uma das lições preciosas de Pierre Hadot consiste em nos esclarecer sobre o vínculo estreito entre o discurso e o modo de vida filosóficos. Nas palavras desse eminente helenista,

(...) A filosofia é, antes de tudo, uma maneira de viver, mas está estritamente vinculada ao discurso filosófico (...). A filosofia não é senão exercício preparatório para a sabedoria. Não se trata de opor, de um lado, a filosofia como discurso filosófico teórico e, de outro, a sabedoria como um modo de vida silencioso que será praticado a partir do momento em que o discurso tiver atingido seu acabamento e sua perfeição (...). (1999, p. 18-19, grifo meu).


Os discursos filosóficos não podem ser considerados independentemente dos filósofos que os produziu. Os discursos filosóficos devem ser vistos como a materialização linguístico-histórica de um exercício espiritual, isto é, de uma filosofia que é, ela mesma, um exercício preparatório para a sabedoria.
Antes de dilucidar a concepção de filosofia como exercício espiritual e o que há que se entender por sabedoria, devo lembrar que formulei a questão que me incita à produção deste texto, recorrendo à palavra valor. Quero dar a conhecer ao leitor em que consiste o valor da filosofia. Não se trata de submeter a filosofia ao valor de uso, supondo servir ela a algum fim. Contra tal suposição, vem a propósito a lição de Deleuze (2001, p. 159), que descreve de maneira clara e direta o caráter afirmativo da filosofia:

Quando alguém pergunta para que serve a filosofia, a resposta deve ser agressiva, visto que a pergunta pretende-se irônica e mordaz. A filosofia não serve nem ao Estado, nem à Igreja, que têm outras preocupações. Não serve a nenhum poder estabelecido. A filosofia serve para entristecer. Uma filosofia que não entristece a ninguém e não contraria ninguém, não é uma filosofia. A filosofia serve para prejudicar a tolice, faz da tolice algo de vergonhoso. Não tem outra serventia a não ser a seguinte: denunciar a baixeza do pensamento sob todas as suas formas. Existe alguma disciplina, além da filosofia, que se proponha a criticar todas as mistificações, quaisquer que sejam sua fonte e seu objetivo? Denunciar todas as ficções sem as quais as forças reativas não prevaleceriam. Denunciar, na mistificação, essa mistura de baixeza e tolice que forma tão bem a espantosa cumplicidade das vítimas e dos algozes. Fazer, enfim, do pensamento algo agressivo, ativo, afirmativo. Fazer homens livres, isto é, homens que não confundam os fins da cultura com o proveito do Estado, da moral, da religião. Vencer o negativo e seus altos prestígios. Quem tem interesse em tudo isso a não ser a filosofia? A filosofia como crítica mostra-nos o mais positivo de si mesma: obra de desmistificação. […] tolice e a bizarria, por maiores que sejam, seriam ainda maiores se não subsistisse um pouco de filosofia para impedi-las, em cada época, de ir tão longe quanto desejariam, para proibi-las, mesmo que seja por ouvir dizer, de serem tão tolas e tão baixas quanto cada uma delas desejaria. Alguns excessos lhes são proibidos, mas quem lhes proíbe a não ser a filosofia? Quem as força a se mascararem, a assumirem ares nobres e inteligentes, ares de pensador?

Deleuze acrescenta que denunciar todas as mitificações é o valor afirmativo da filosofia. Em suma, “a filosofia como crítica diz-nos o mais positivo de si própria: a empresa da desmitificação”. A questão, em torno da qual se constitui o presente texto, não assume a forma do para que serve, mas enuncia-se a partir do horizonte dos valores; em última instância, do sentido. Ora, valores são partes integrantes de todas as culturas (em tempo, definirei o conceito de cultura que esposarei ao longo de toda essa discussão). Os valores influenciam a maneira como as pessoas escolhem e como os sistemas sociais se desenvolvem. Um valor é uma ideia de que se usam os indivíduos para categorizar coisas em relação a outras, segundo critérios tais como desejabilidade, mérito, perfeição, proveito, importância, etc. Todo valor cultural é usado para classificar qualquer coisa, desde abstrações até objetos, experiências, comportamentos, características pessoais, modos de ser, etc. É bem verdade que há gostos e preferências pessoais, caso em que a única autoridade é o indivíduo. Mas, não nos enganemos: os valores são culturalmente estabelecidos e são percebidos como realidades fora dos indivíduos.
Perguntar pelo valor da filosofia é, portanto, perguntar pelo seu mérito, pela sua importância. Convém, agora, fazer entender o leitor o que significa a concepção de filosofia como exercício espiritual. Enquanto prática de exercícios espirituais, a filosofia congrega práticas quer de ordem discursiva, quer de ordem física, como regime alimentar, quer ainda intuitiva, como a contemplação, todas destinadas a cunhar modos de ser. A filosofia como exercício espiritual se destina a operar uma transformação radical na personalidade, na estrutura psicofisiológica, na sensibilidade e na visão de mundo daquele que a esse exercício se entrega.
O filósofo, enquanto amante da sabedoria, põe-se obstinadamente a buscá-la, sem nunca alcançá-la. E nem poderia, pois, se o conseguisse, deixaria de ser filósofo. É que o filósofo é o amante da sabedoria, é quem se põe a caminho, quem se dedica a buscá-la. Mas a sabedoria não é uma coisa passível de ser possuída; é um modo de ser, um modo de vida. O filósofo aspira à sabedoria, sem jamais alcançá-la. É nessa impossibilidade que reside a força de seu amor inquebrantável pela sabedoria. Pois o amor é tanto mais forte quanto mais nos empenhamos na busca do objeto desejado. Vamos ouvir novamente Hadot (2014, p. 278):

A sabedoria é o estado ao qual talvez o filósofo jamais chegará, mas ao qual ele tende esforçando-se para transformar a si mesmo a fim de se ultrapassar.


A sabedoria é um modo de ser, um modo de existência, caracterizado por três aspectos essenciais: a paz da alma (ataraxia), a liberdade interior (autarkeia) e (exceto para os céticos) a consciência cósmica, isto é,  a tomada de consciência do pertencimento ao Todo humano e cósmico. A filosofia, tomada como uma espécie de terapêutica, destina-se, antes de tudo, a produzir a ataraxia (a paz da alma), libertando o ser humano da angústia, angústia provocada pelas preocupações da vida, mas também pelo mistério da existência humana: medo dos deuses, terror da morte (ibid., p. 279).
A filosofia, tal como nos ensinou Aristóteles, começa com a admiração, quer dizer, com o ser abalado. A experiência do admirar-se envolve a experiência de uma radical desorientação relativamente ao modo como nos encontramos no mundo. A admiração é, em grande medida, uma forma de desilusão: a libertação de um estado comum de entorpecimento, de letargia. O filósofo é, assim, um ser permanentemente admirado, inquieto sim; atormentado, muitas vezes, mas sempre interessado no mistério do real, ocupado com as graves e fundamentais questões que tocam à totalidade da existência e da condição humana. Na admiração, o filósofo é quem se dá conta de que a realidade excede sempre as pretensões que temos de esgotá-la através do conhecimento. Na admiração, o filósofo se abre ao encontro do ser como acontecimento incompreensível e misterioso.


2. A condição humana: sua dimensão cultural

Passarei a considerar a condição humana a partir de um primeiro aspecto: sua inscrição na ordem da cultura. Para tanto, refiro as palavras de Gramsci, em Concepção Dialética da História (1966, p. 12) que, fazendo eco a Nietzsche, recorda nossa condição de animais gregários:


Pela própria concepção de mundo, pertencemos sempre a um determinado grupo, precisamente o de todos os elementos sociais que partilham de um mesmo modo de pensar e de agir. Somos conformistas de algum conformismo, somos sempre homens-massa ou homens-coletivos. (grifo meu).


O cotidiano em que todos nós nos movemos é regulado por uma disciplinarização da ordem do tempo, pela necessidade de reprodução da existência física: pela necessidade de comida, vestimenta, moradia; é o espaço das lutas pelo poder  de utilizar os bens de consumo, das ocupações da diversão: celular, cinema, jogos, etc. É, em suma, o mundo do trabalho, regulado pela utilização, serventia a fins. O mundo do trabalho é o mundo do rendimento, do exercício das funções, o mundo da fome e do modo de saciá-la. O mundo do trabalho é dominado pelo objetivo da realização da utilidade comum. O cotidiano recobre a dimensão da vida social em que os homens se encontram em estado de rebanho; é onde os homens tomam parte de uma coletividade como animais de rebanho. Nesse estado, os animais humanos têm propensão à preguiça; por toda parte, encontram-se entediados, comportando-se segundo os costumes e as convenções de sua sociedade; adotando irrefletidamente as opiniões alheias, seguindo os modismos do rebanho.  O animal de rebanho, que é o homem em sua relação originária com o mundo – que é um campo de relações – vive uma vida anestesiada, reverenciando e adotando passivamente as significações partilhadas e herdadas por foça de suas práticas culturais. Para Gramsci, a visão de mundo desses homens-massa não é crítica e coerente, mas ocasional e desagregada. É em virtude disso que eles se tornam parte da multidão dos homens-massa. A personalidade desse tipo humano é constituída como uma concha de retalhos “nela se encontram elementos de homens das cavernas e princípios da ciência mais moderna e progressista, preconceitos de todas as fases históricas passadas, grosseiramente localistas, e intuições de uma futura filosofia que será própria de um gênero humano mundialmente unificado”.
A crítica de nossa visão de mundo, na condição de animais de rebanho, visa a garantir a unidade e a coerência de que nossa vida carece:

O início da elaboração crítica é a consciência daquilo que somos realmente, isto é, um “conhece-te a ti mesmo” como produto do processo histórico até hoje desenvolvido, que deixou em ti uma infinidade de traços sem benefício no inventário. (ibid.).


Ainda, segundo Gramsci, não é possível nos tornarmos filósofos, isto é, construirmos uma visão de mundo criticamente coerente, “sem a consciência de nossa historicidade, da fase de desenvolvimento por ela representada e do fato de que ela está em contradição com outras concepções ou com elementos de outras concepções”. (p. 13). Para Gramsci, a filosofia é a crítica e a superação tanto da religião quanto do senso comum. A religião é um elemento do senso comum desagregado. Mas há muitos sensos comuns, pois que “[são] um produto do devir histórico” (p. 14).
Imerso na cotidianidade mediana, o animal humano pensa e age segundo um complexo de crenças, supostas certezas, concepções, preconceitos, ideologias, valores, símbolos; em outras palavras,  segundo um complexo de representações coletivas formadoras dos modos de pensar, agir e sentir que são gerais e permanentes numa sociedade ou grupo social particular. A esse complexo se dá o nome de senso comum. O senso comum abriga saberes:

a) subjetivos, pois exprimem sentimentos e opiniões individuais ou de grupos, que variam de uma pessoa para outra, ou de um grupo para outro, dependendo das condições sócio-culturais em que vivem os indivíduos;

b) fundados em avaliação qualitativa das coisas conforme os efeitos que elas produzem em nós ou conforme os desejos que provocam em nós, ou conforme o tipo de finalidade que lhes atribuímos;
c) que tendem a generalizações, pois reúnem numa só opinião ou numa só ideia coisas julgadas semelhantes;
d) por serem generalizadores, tendem a estabelecer relações de causa e efeito entre coisas: “onde há fumaça há fogo”;
e) não se fazem acompanhar da admiração com a regularidade, constância e diferença das coisas; ao contrário, a admiração se atém ao que é imaginado como único e extraordinário ou miraculoso.
f) baseiam-se, comumente, em projeções de sentimentos de angústia e de medo nos acontecimentos do mundo, sobretudo quando da ordem do desconhecido.

Como bem lembra Thompson, em Ideologia e Cultura Moderna (2011, p. 22), “o conceito de cultura tem uma história própria, longa e complicada, que provavelmente tem produzido tantas variantes e tanta ambiguidade como a história do conceito de ideologia”. Por isso, urge reinscrever o conceito num horizonte semântico bem determinado. Thompson segue Geetz, e eu os acompanharei, na definição de cultura como sistema de símbolos e significados da vida social, como um produto de padrões significativos incorporados às formas simbólicas compartilhadas na interação social. No entanto, Thompson adverte: as formas simbólicas devem ser tomadas como partes integrantes de contextos sociais estruturados, que envolvem relações de poder, formas de conflito, desigualdade em termos de distribuição de recursos, etc.

Tomar as formas simbólicas como fenômenos contextualizados é vê-las como geralmente produzidas e recebidas por pessoas em contextos sócio-históricos específicos e providas de recursos e capacidades de vários tipos. (Ibid.).


Um aspecto importante da abordagem do caráter sócio-histórico das formas simbólicas repousa no fato de que elas se tornam objetos de processos complexos de valoração e conflito. Os processos de valoração são aqueles por meio dos quais é conferido às formas simbólicas determinado valor. Há dois tipos de valor que se associam, normalmente, às formas simbólicas: o valor simbólico e o valor econômico. Importa apenas aqui considerar o valor simbólico. Esse valor é atribuído às formas simbólicas em função das maneiras como as pessoas as apreciam ou as denunciam, as desejam,  as adotam ou as desprezam.
Reymond Williams se debruçou sobre a investigação da complexa história do desenvolvimento do conceito de cultura. Ele distinguiu entre três significados modernos da palavra. O primeiro deles, remontando às raízes etimológicas – “cultura” tinha o sentido de “agricultura” - , era o “cultivo de conhecimentos”. No século XVIII, passou a ser sinônimo de civilização, no sentido de que designava um processo geral de progresso intelectual, espiritual e material. Civilização recobria aí os costumes e a moral: ser civilizado inclui não cuspir no tapete e não decapitar pessoas, por exemplo. Como sinônimo de civilização, cultura inscrevia-se no espírito geral do Iluminismo, com seu culto de autodesenvolvimento secular e sua crença no progresso. Civilização era, em grande medida, uma noção francesa: supunha-se que somente os franceses tivessem o privilégio de ser um povo civilizado. Nesse sentido, cultura era o mesmo que refinamento social. Se a civilização francesa se caracteriza por uma vida dedicada à política, à economia e à técnica, a cultura germânica se caracterizava por seus gostos religioso, artístico e intelectual. Nesse contexto sócio-histórico, por cultura entendia-se o refinamento intelectual de um grupo ou indivíduo, donde a crença na possibilidade de discriminar entre os que têm cultura e os que são incultos.
No século XIX, o conceito de cultura deixa de ser sinônimo de civilização, torna-se seu antônimo. O conceito de civilização, como sinônimo de cultura, tem uma parte descritiva e uma parte normativa, porquanto tanto pode designar uma forma de vida (civilização asteca) como prescrever tacitamente um padrão de vida considerado harmonioso, esclarecido e refinado.
Atualmente, o adjetivo “civilizado” tem essa orientação normativa. Civilização recobre práticas artísticas, a vida urbana, política cívica, tecnologias complexas, etc., e tudo isso tende a ser considerado um avanço em relação ao que havia antes.
Na medida em que os caracteres descritivo e normativo da palavra “civilização” se separam, a noção de civilização passa a recobrir as boas maneiras, o refinamento, politesse, a desenvoltura elegante nos relacionamentos de grupos que compunham a classe média europeia pré-industrial. “Cultura” é, assim, uma questão de desenvolvimento total e harmonioso da personalidade. Mas tal desenvolvimento só pode ser realizado nas relações sociais. Como são necessárias certas condições sociais para que seja possível tal desenvolvimento, supõe-se que o Estado deve contribuir para favorecê-las. Passou-se, então, a crer que a cultura tem também uma dimensão política. É o intercurso social que tornaria possível desfazer a rusticidade rural e conduzir os indivíduos para relacionamentos complexos.
É na ordem das práticas culturais, definidas como práticas de produção de símbolos e significados, que se deve pensar a constituição da rede de sentido e amparo da existência humana. Definindo o sentido como a consciência de que existe uma relação entre as experiências, Berger & Luckmann (2012, p. 27) ensinam que “é difícil conceber uma sociedade sem um sistema de valores e sem reservas de sentido a ele adaptados”. Os acordos quanto ao sentido desenvolvem-se em comunidades de vida, as quais “são caracterizadas por um agir que se repete com regularidade e diretamente recíproco em relações sociais duráveis” (p. 28). Segundo os autores, as comunidades de vida “pressupõem um mínimo de comunhão de sentido”. (ibid.). O agir do indivíduo é marcado pelo sentido objetivo colocado à disposição pelos acervos sociais do conhecimento e comunicado pelas instituições por meio da pressão que exercem para que seja adotado. As instituições são responsáveis, portanto, por gerar sentido, controlar seus estoques e comunicá-lo às comunidades de vida em que um indivíduo cresce, trabalha e morre. As reservas de sentido objetivadas e processadas pela sociedade são conservadas em reservatórios históricos de sentido e administrados por instituições. Elas se encarregam de conservar e disponibilizar o sentido tanto para fins de orientação do agir do indivíduo em diversas situações quanto para fins de orientação de seu comportamento. Em todas as sociedades, com maior ou menor pressão, as instituições, por meio da educação ou da doutrinação, têm em vista a necessidade de que o indivíduo pense e se comporte segundo as expectativas e as normas da sociedade. Nas sociedades pré-modernas, por meio do controle e censura do que era publicamente comunicado, ensinado, pregado, não havia espaço para opiniões divergentes.
A dimensão cultural da condição humana evidencia, entre outras coisas, que o mundo é, em certo sentido, o campo de todos os campos de sentido; e num sentido estrito, é cada um dos campos de sentido em cujos limites se articulam nossas vivências, nossas práticas existenciais, historicamente condicionadas. As comunidades de sentido  podem ou não se tornar comunidades de vida. As comunidades de sentido se constituem de diferentes níveis de sentido, não diretamente baseados na experiência de vida e podem abrigar diferentes campos de sentido (o filosófico, o científico, o jornalístico, etc.).
A cultura, sendo o mundo próprio do animal humano, mundo cuja essência é ser mundo simbólico, é um campo de produção de ficções. Nossa vida depende da produção de ficções. O que são ficções? São criações da imaginação. Elas não são nem verdadeiras nem falsas. Talvez, não as escolhamos, não obstante, elas conformam e estruturam, dotando de sentido, nossas vivências e experiências coletivas. As ficções não podem ser geradas ao bel-prazer; talvez, por isso, não possam ser descartadas sempre que desejamos. Ainda que as ficções, sem as quais o que nos restaria seria o desespero niilista, sejam obra do engenho e da atividade humana, elas escapam ao controle do animal humano.
Hadot (2014, p. 322) lembra-nos que “o homem deve se separar do mundo enquanto mundo para poder viver sua vida cotidiana e deve se separar do mundo cotidiano para reencontrar o mundo enquanto mundo”. Essa experiência de reencontro com o mundo enquanto mundo não é possível senão pelo exercício da filosofia – é o que tentarei mostrar. O homem comum vive chapado ao cotidiano, imerso nesse mundo do trabalho e das ocupações, alienado de si. Urge aqui assinalar que a filosofia não pretende nem pode retirar do homem as ficções que lhes possibilita viver, pois que a capacidade de produzir ficções é inerente à estrutura psicofisiológica do homem enquanto animal simbólico; privá-lo das ficções seria desumanizá-lo. O que a filosofia faz - e nisso reside seu mérito, seu valor - é fazê-lo despertar para o fato de que esse mundo familiar, do cotidiano, da produção e reprodução da existência física, do entretenimento, das lutas políticas; esse mundo donde grandes edifícios de representação simbólica (a religião, a arte, a filosofia, a ciência) se elevam “como gigantescas presenças de outro mundo” (Berger & Luckmann, 2007, p. 61) são formas de mundo geradas, fabricadas graças ao trabalho de produção de ficções viabilizado pela linguagem.


3. A loucura da condição humana

A rotina cultural é o que vai assegurar o ajustamento dos indivíduos ao modo de funcionamento do sistema social. É o que evita que eles enlouqueçam. Mas há outra forma de loucura, que não é a do esquizofrênico. Há uma loucura na normalidade, no ajustamento à vida normalizada. Nesse caso, a loucura é estruturante da condição humana, conforme nota Becker (2013, p. 228-229):

Houve uma época em que eu ficava imaginando como é que as pessoas aguentavam trabalhar em torno daqueles infernais fogões de hotéis, o frenético torvelinho de servir uma dúzia de mesas ao mesmo tempo, a loucura do escritório de um agente de viagens no auge da temporada de turismo, ou a tortura de trabalhar o dia inteiro na rua com uma perfuratriz pneumática, num verão calorento. A resposta é tão simples, que nem a percebemos: a loucura dessas atividades é exatamente a da condição humana. Elas estão “certas” para nós, porque a alternativa é o desespero natural. A loucura diária desses empregos é uma repetida vacina contra a loucura do hospício. (grifos meus).

Becker argumenta que os homens se ocupam devotadamente ao seu trabalho, às vezes, até com alegria, porque “o trabalho abafa algo mais sinistro”. Os homens precisam se proteger contra o terror de que seriam tomados se viessem a compreender o real em sua crueza e nudez. Que crueza e nudez são essas?
 Vivendo numa permanente autotapeação, num permanente estado de autoengano, os animais humanos se ocupam com seus negócios, participam como autômatos do funcionamento da ordem social, mantendo fora de sua consciência a representação de uma verdade que se recusa a calar:


(...) a vida humana pode não passar de um interlúdio insignificante de um perverso drama de carne e osso que chamamos evolução; que o Criador talvez não se importe com o destino do homem ou com a autoperpetuação de indivíduos mais do que parece ter-se importado com os dinossauros ou com os tasmânios. Essa voz que sussurra é a mesma que nos chega incongruentemente da Bíblia, nas palavras do Eclesiastes: tudo é vaidade, vaidade das vaidades. (p. 230).

Essa espécie de loucura, própria da condição humana, se nos revela aqui apenas sob um dos seus muitos aspectos. O aspecto dessa forma de loucura que pretendo sublinhar não repousa propriamente no fato de os homens terem de fazer o que fazem, já que, dada a forma histórica de nossas sociedades contemporâneas, eles se veem constrangidos pelas necessidades da subsistência a trabalhar como trabalham; o que caracteriza a loucura própria da condição humana é que o animal humano acredita que o que faz tem alguma importância transcendente, algum profundo significado para a totalidade ordenada do universo. Sua loucura, que, na verdade, é seu delírio de grandeza, é acreditar que, ao fazer o que faz, ao participar coletivamente da fabricação desse mundo (de ficções) que lhe torna possível viver, esgota a totalidade e complexidade do mundo e garante para si um status especial, uma posição privilegiada relativamente às demais espécies de animais com as quais ele coexiste nesse mundo mais vasto, mais cheio de beleza, terror e mistério.  
O animal humano é um ser infeliz que sabe que a morte é seu destino inevitável; mesmo ciente do vaticínio de seu fim, tem que continuar a viver. O homem é ser cindido, rachado. Os obstáculos para a sua autorrealização não se acham apenas no mundo, mas em si mesmo.  Se a saúde é a condição natural das outras espécies de animal, no animal humano, o normal é a doença. Freud soube reconhecer a dívida para com Schopenhauer, o qual se antecipou à visão fundamental da psicanálise. Schopenhauer via no instinto sexual a força motora básica da vida humana. Seu conceito de Vontade equivale ao de pulsões que influenciam a vida humana à revelia do eu. É a Vontade inconsciente que nos governa. O Id da psicanálise é a Vontade cega de Schopenhauer.
Para Freud, a busca da felicidade é uma distração do viver. O homem contemporâneo crê que cada um encontrará a realização de si sendo a pessoa que realmente quer ser. Em cada um de nós, existem possibilidades únicas à espera de desenvolvimento. Nosso infortúnio é que essas possibilidades são, em grande medida, frustradas. O homem comum passa a vida num estado de turbulência esperançosa. Encontra significado no sofrimento acarretado pela luta pela felicidade. Na ânsia de fugir ao vazio, o homem se apega praticamente a esse estado de feliz aflição. Para Freud, não há nenhum eu verdadeiro a ser encontrado. A mente é um caos. Os homens devem-se esforçar pela construção do ego, e não se aferrar à busca de um eu interior fictício. A alma humana está irremediavelmente cindida: a divisão da alma decorre, em grande medida, da repressão do desejo. E essa repressão é inevitável, porque,  onde há vida civilizada há perda da satisfação das pulsões. O homem, portanto, traz em si um buraco, um abismo; nasceu quando se recusou a morrer ajustado à ordem natural. Nessa recusa, perdeu sua unidade e se tornou um ser rachado. Tendo a ordem simbólica feito sua imersão na ordem natural, o animal humano pôde fabricar uma segunda natureza (a cultura). Esta foi inventada para lhe turvar ou impedir a visão do abismo que o constitui. Como bem assinala Silva (2015, p. 283), “o homem ensaia a pose de um deus (...), [mas] morre como um animal qualquer”.
Antes de pôr fim a esta seção, ajunto que o animal humano, embora seja capaz de produzir conhecimento numa velocidade crescente, revela-se, ao mesmo tempo, cronicamente incapaz de aprender com os erros. Os seres humanos tendem a cometer os mesmos erros. A civilização pode até parecer conatural a eles, mas também a barbárie o é. A evidência científica e histórica permite dizer que os seres humanos são só parcial e intermitentemente racionais.
Nosso cérebro é uma máquina de produção de crenças, um aparelho avançado e complexo de reconhecimento de padrões que, articulando as experiências, criam significados a partir desses padrões que cremos existirem na natureza. Padronicidade é a tendência a encontrar padrões significativos em dados de experiência que podem ou não ser significativos. Acionalização é a tendência a infundir nos padrões significado, intenção e ação. Nós, seres humanos, quase sempre, projetamos ação e intenção nos padrões que encontramos e acreditamos que esses agentes intencionais invisíveis controlam o mundo.
O animal humano também se mostra bastante relutante em abandonar suas crenças. A dissonância cognitiva é a condição normal do animal humano. A teoria da dissonância cognitiva explica o fato, bastante comum, de os seres humanos evitarem confrontar suas crenças e percepções com a experiência empírica. Sempre que elas são confrontadas com a experiência, eles buscam dirimir o conflito reinterpretando a experiência de modo a conservar as crenças a que eles são irresolutamente apegados. O animal humano não suporta a frustração de suas expectativas, tampouco a falsidade de suas crenças. Se no confronto com a experiência, suas crenças não se sustentarem, o animal humano fará de tudo para “salvá-las”, buscando reinterpretar a experiência conflitante.


4. Viver é ocupar-se de si: a filosofia como arte de viver

A filosofia, enquanto modo de viver, enquanto exercício espiritual, é uma prática de profunda intimidade com a vida. A filosofia, enquanto arte de viver, tem em vista quem eu me torno com o exercício e a escrita filosóficos. É a partir do exame do modo de vida estoico que pretendo mostrar ao leitor que o mérito da filosofia está  em nos permitir o exercício da mais plena liberdade: o poder de autoconstituição, de formação de si, de liberação da tirania mais tenaz – a tirania das paixões. 
O problema estoico é como se vive. O mal estoico é a alienação de si. O grande perigo é a perda de si. Ser sábio é o bem estoico. Como celebrar a conquista sem que eu me perca? Como não me atormentar com a possibilidade de males futuros? O sábio torna-se presente ao que se apresenta.


4.1. A prática estoica de cuidado de si

O Estoicismo, fundado por Zenão de Cício, no início do século III a.C., deriva seu nome de Stoá, que significa pórtico, pois foi perto do Pórtico Poecilo que a escola surgiu. O estoicismo constitui um sistema integrado de lógica, física e ética, articulados a princípios comuns que dão forma a uma paidéia, a um projeto pedagógico. Os historiadores da filosofia costumam dividir o estoicismo em três períodos:

1) Primeiro Período (estoicismo antigo), que se desenvolveu no século III a.C. Nesse período, se constituiu o sistema estoico mais completo: a lógica, a física, a metafísica e a ética.

2) Segundo período (estoicismo médio, séc. II a.C.), época em que o estoicismo entra em contato com o espírito romano, com o qual se combinará muito bem.

3. Terceiro período (estoicismo imperial). Entre os seus principais representantes estão Sêneca, nascido no início da era cristã, século I d.C.; Epiteto (séc. II) e Marco Aurélio (séc. II).

O estoicismo romano, que se desenvolveu ao longo desse terceiro período, interessa-se pela produção da liberdade, compreendida como autarkeia (autossuficiência, autonomia).
A física estoica baseia-se no postulado segundo o qual tudo que existe são encontros de corpos. Deus é imanente ao Todo, ao mundo: ele se dá como acontecimento de sentido em cada encontro. O divino é o Lógos. O Lógos é uma potência divina e ordenadora, que permeia, sustenta e governa toda a realidade. O lógos anima e move todas as coisas naturais, fazendo delas o que são. Nós, seres humanos, somos também manifestações desse lógos e, portanto, devemos agir e viver consoante a racionalidade do Cosmo em geral. A Razão Universal imanente ao Cosmo é o Lógos. Viver, pensar e agir em conformidade com a Natureza é viver, pensar e agir em conformidade com a Razão Universal imanente ao Cosmo. É nisso que consiste a sabedoria estoica. A adesão e a conformidade à Natureza são próprias do sábio. Viver em conformidade com a Natureza nada mais é do que viver em conformidade com a razão, tanto a Razão Universal como com a razão individual de cada ser humano, parcela que é da Razão Universal, centelha do fogo universal, ou seja, do Lógos.
Mesmo ciente de que lógica, física e ética mantêm entre si relações de repercussão e que, portanto, devem ser compreendidas em suas articulações no interior do sistema de pensamento estoico, para fins desta exposição, vou-me concentrar em tratar da ética, visto que seu estudo nos permite descerrar os elementos mais diretamente ligados à autoconstituição de si, às práticas de cuidado de si.

  

4.1.2. A ética estoica

Diógenes Laércio sustentava que os estoicos distinguiam, na ética, o impulso ou tendência (hormé); os bens e males; as paixões (pathé), a virtude (areté); o sumo bem (télos); as ações, as condutas convenientes (kathekonta); e o que convém aconselhar ou impedir.
A virtude ou areté é a excelência, a perfeição ou completude de alguma coisa em conformidade com a sua natureza e finalidade. A virtude é uma disposição (héxis) para viver em conformidade com a Natureza (physis). O objetivo da virtude é a vida feliz, e esta é o fim (télos) alcançado pela conformidade da natureza humana com a Razão Universal (Lógos).  A virtude é desejável por si mesma, e não pela esperança de uma recompensa ou por medo do castigo. Assim, o estoico não é virtuoso por fazer o bem, mas faz o bem porque é virtuoso. O bem é a retidão: é estar em conformidade com o Lógos. A virtude é um saber: é a ciência dos bens e dos males.
O sábio é livre – o único verdadeiramente livre – porque quer o necessário, o destino, o acontecimento; livre também porque se basta a si mesmo (autossuficiência), pois o Lógos possui tudo de que ele necessita. Nada pode perturbá-lo (ataraxia/ apatheia). O sábio é feliz, o único verdadeiramente feliz. O que é a felicidade, pois, para o estoico? É este instante em que um homem está inteiramente de acordo com o acontecimento, isto é, com o Destino, com a Natureza. É necessário, a esta altura, esclarecer o que os estoicos entendiam por Destino; mas o farei na seção seguinte. Fazem-se antes necessárias algumas considerações mais sobre a vida virtuosa.
Toda ação ética é orientada para um fim único (télos), em vista do qual todo o resto é o meio ou fim parcial. O fim último da ação ética é a felicidade (eudaimonia) daquele que vive bem porque realiza plenamente sua natureza. Os estoicos consideravam que a virtude basta para que a felicidade seja alcançada. A virtude é a causa da felicidade, mas não é ela o télos ou o sumo bem. O sumo bem é viver em conformidade com a Razão Universal, com a Natureza, isto é, em conformidade (homologia) consigo mesmo e com a ordem do mundo.  A infelicidade, por seu turno, é viver em desacordo consigo e com a Natureza ou com a ordem do Cosmo.


4.1.3. O Destino, segundo os estoicos

Em princípio – e para que se desfaça qualquer suposição equivocada -, os estoicos rechaçavam a ideia trágica do destino como uma força transcendente que dirige os homens sem que estes o saibam. Para o estoicismo, o Destino é uma realidade natural, inscrita na ordem do Cosmos. O Destino, na verdade, é a ordem e conexão naturais de todas as coisas, o nexo causal necessário ou nó das coisas. Não há acaso, contingência no Universo, para o estoico. Destino quer dizer: tudo é necessário.
Destino é também uma força cósmica e divina, o Lógos: força vital, sopro divino, tensão que organiza e contém o Todo. É a vida do mundo. O Destino entrelaça as coisas em relações mútuas de amizade e simpatia. Cuidemos  de não concluir que, para o estoicismo, somos escravos de uma ordem necessária, do Destino. A ética estoica nos ensina que, embora os acontecimentos estejam conectados por redes causais e estejam estritamente presos uns aos outros, há coisas que estão em nosso poder; por conseguinte, é preciso admitir que há coisas que não acontecem pela força do destino. Um dos exercícios espirituais estoicos consiste em exercitar-se na meditação sobre o que está e o que não está em nosso poder? Quantos homens, por leviandade e insensatez se queixam de acontecimentos que, trazendo-lhes importunos ou infortúnios, não estão sob o poder de deliberação deles?
Assim, 1) há causas que são imanentes e dependem de nós; 2) há, porém, causas antecedentes que são exteriores a nós, não dependem de nós e sim do destino. Por exemplo, a chuva cai no dia em que estou sem guarda-chuva. Os juízos de assentimento dependem de nós, mas depende apenas das coisas externas imprimir em nós sua imagem e não somos livres para recebê-las nem recusá-las. As coisas de que se diz “boas” são aquelas que são intrinsecamente conforme à razão; as coisas de que se diz “más” são aquelas que são contrárias à razão. Ocorre que nós, seres humanos, produzimos juízos com base nos afetos; dependendo de nossa conformação afetiva, podemos considerar más coisas que, na verdade, nos são indiferentes. Os estoicos ensinam-nos que exercitemos a indiferença judicativa e axiológica: há coisas que não dependem de nós; não devemos nos apegar àquilo que nos faz sofrer; trata-se de sofrer sem absolutizar a dor; tampouco devemos nos exultar com um bem, absolutizando-o.
O homem escravo das paixões acredita que a liberdade consiste em desejar que tudo aconteça conforme o seu desejo. O sábio, por seu turno, compreende que a liberdade verdadeira consiste em afirmar as coisas que acontecem tal como acontecem e em saber como agir quando acontecem, cooperando com o destino. Para o estoicismo, nós somos um elemento corporal do Cosmos. Não somos uma coroa da Criação; não gozamos de alguma superioridade relativamente aos demais seres que integram a ordem cósmica. Tudo tem um sentido no Cosmo, embora não saibamos qual é. A questão, para o estoicismo, é, nesse tocante, como produzir a liberdade em meio a relações de sentido pelas quais nós não somos responsáveis totalmente.  A liberdade é a vida que pertence a si mesma.  É que “vida”, para um estoico, não é existência, mas estar ocupado de si. Destino é destinar-se: o destino  me destina aquilo que vivo, cabe a mim integrar os elementos da destinação ao meu viver, tornando-os meus. Devo cultivar um modo de ser pelo qual eu me elabore para ser senhor de mim mesmo em face de tudo que se destina. Desenvolverei melhor a significatividade estoica de “vida”, “liberdade” e “sabedoria” a partir de alguns textos de Sêneca, que serão referidos adiante.

  

5. Da brevidade da vida

Vou-me deter no exame de alguns fragmentos de textos colhidos da obra Da brevidade da vida, que abriga um conjunto de cartas destinadas a Paulino (cuja identidade é incerta), nas quais o filósofo discorre sobre a finitude da vida humana. Considere-se o primeiro fragmento:


Não temos exatamente uma vida curta, mas desperdiçamos uma grande parte dela. A vida, se bem empregada, é suficientemente longa e nos foi dada com muita generosidade para tarefas importantes. Ao contrário, se desperdiçada no luxo e na indiferença, se nenhuma obra é concretizada (...) sentimos que ela realmente se esvai.


A primeira questão que é preciso considerar é a da brevidade da vida. Sêneca cuida que há formas de agir e de viver que abreviam a vida. A brevidade de uma vida depende do modo como se vive, Portanto, a brevidade não é uma qualidade extensional da vida. Não se trata de pensar a brevidade da vida à luz do regime de Krónos (do tempo cronológico). A brevidade é um conceito intensivo, de modo que uma vida será breve ou longa dependendo do modo como a vivemos. Ter uma vida longa, mesmo que venhamos a morrer com 30 anos, é ter uma vida intensa, isto é, uma vida ocupada consigo mesma. Uma vida dispersa que durou 100 anos é uma vida breve. Numa vida dispersa, numa vida desperdiçada, em tudo que eu  realizo eu não me realizo. Ora, Sêneca censura o modo de vida do homem da multidão. A multidão é tudo que eu realizo sem me realizar. Na multidão, não somos quem somos e somos os outros; mas os outros não é ninguém. A vida escrava da multidão experimenta a brevidade de tudo; é vida que se perde a si mesma. Se eu vivo, vivo segundo o que acontece. A vida do sábio é vivida segundo o que acontece. Mas a maior parte dos seres humanos – ensina Sêneca – vive acordada como se estivesse dormindo.
Quem dispersa a si mesmo, quem vive inteiramente sob o modo da ocupação com as coisas sem ocupar-se de si desperdiça o tempo; mais ainda, experimenta o tempo como perda. Sua existência é perda de si sob o regime do tempo cronológico que sempre aniquila a si mesmo.  O que se deve destacar aqui é: podemos existir sem viver. Porque vida é ocupar-se de si. A vida nunca é cronologicamente mensurável. Apenas uma existência cativa experimenta o tempo como tempo cronológico. Foi assim: a vida é maldição e castigo. Cuidemos em considerar mais um fragmento abaixo:

(...) é consenso que um homem ocupado não pode fazer nada bem (...) não se aprofunda em nada, ao contrário, tudo que lhe é imposto rejeita. Nada está mais longe do homem ocupado do que viver, nenhuma coisa é mais difícil de aprender (...) Deve-se aprender a viver toda a vida e (...) por mais que te admires, durante toda a vida se deve aprender a morrer”. (grifo meu).

O homem, na ocupação, entregue ao mundo do impessoal, é refém da transitividade da ocupação. Quem se ocupa só das coisas não suporta integrar a totalidade de sua vida a si mesmo.  Para os que se ocupam das coisas, o tempo é fluxo, e a vida é o eterno retorno da aniquilação. Aprender a morrer é um exercício do meu viver. No fragmento cuja leitura nos ocupa, Sêneca quer-nos chamar a atenção para o fato de que a morte é um problema da totalidade da vida. Aprender a morrer é uma tarefa da vida inteira. A filosofia – e, nesse tocante, Sêneca recupera Sócrates – é um exercício de preparação para a morte. Mas essa tarefa só pode ser levada a efeito por uma vida que se ocupa de si, por alguém que vive a integralidade da vida. Quem vive a integralidade da vida não a vive segundo o regime do tempo cronológico, mas a vive integrando o passado porque dá significado ao passado no seu presente. O sábio nunca vive uma vida breve, porque a vida se dá integrada a ele. Para o sábio, a vida é inteireza. A extensão da vida do sábio se dá na grandiosidade, na intensidade do que viveu. Uma vida longa, portanto, é uma vida que se intensificou no curso de sua mortalidade. Na ocupação consigo, sempre se tem o seu tempo.  A questão que se impõe a nós, leitor, e que reclama resposta é: que horizonte temporal é este do sábio que ele não perde passado? A resposta depende de que atentemos para o próximo fragmento. Irei dividir o fragmento em duas partes, a fim de tornar mais fácil a compreensão do que está em jogo nele:


A vida se divide em três períodos: aquilo que foi, o que é e o que será. O que fazemos é breve, o que faremos é dúbio, o que fizemos, certo. Na verdade, o destino perdeu o controle sobre o passado, ninguém pode querer recuperá-lo. Os homens ocupados admitem isso. (...) eles não têm tempo para olhar para o passado e, se tivessem, lhes seria desagradável a recordação de algo penoso (...).


No começo do fragmento, se nos é apresentada a temporalidade do tempo cronológico: o presente é o período do fazer, que é breve; o futuro, do fazer incerto; e o passado, do que já foi feito, do “foi assim”.  É assim que o homem ocupado com as coisas, imerso no mundo da impessoalidade, experiencia o tempo. O tempo cronológico é uma modalidade do tempo. Na vida ordinária, nossas atividades se estruturam segundo o regime do tempo cronológico. Os homens-massa de nossas sociedades de massa são homo consumens, isto é, homens que consomem. Uma vida sob o regime do consumo é uma vida que se consome, que se corrói. A experiência que o homem desocupado de si e ocupado com as coisas tem do tempo é a mesma experiência do consumo em nossas sociedades capitalistas. O tempo, para ele, é experienciado como tempo que se aniquila a si mesmo:  quanto mais dilatado é o passado menor é a possibilidade de futuro.  Mas o tempo estoico não é o tempo de Krónos, mas o tempo de Aion, o tempo ilimitado, o tempo do acontecimento (o acontecimento jamais é o tempo presente, nem é sua efetuação espaço-temporal). O homem ocupado experiencia a passagem do tempo como vida que se vai abreviando, se devorando. A recordação do passado causa-lhe angústia porque, para ele, quanto mais passado se acumula mais próximo da morte ele fica. Consideremos a segunda parte do fragmento:

Cada dia só está presente por alguns momentos, mas todos os dias do passado a ti se apresentam quando assim ordenas: consentem que sejam detidos e inspecionados pelo teu juízo, alho que aos homens ocupados falta tempo para fazer. Uma alma segura e tranquila pode correr por todos os momentos da vida; todavia, os espíritos dos homens ocupados estão sob um jugo, não podem dobrar sobre si próprios, não podem se contemplar.
Por conseguinte, a sua vida se precipita nas profundezas e, assim como de nada serve a vasilha sem fundo, nada pode trazer de volta o tempo, não importa quanto ele te foi dado, se não há onde retê-lo (...) o tempo presente é brevíssimo, ao ponto de, na verdade, não ser percebido por alguns. De fato, ele está sempre em curso, flui e se precipita, deixa de existir antes de chegar; não pode ser detido do mesmo modo que o mundo e as estrelas (...) Assim, somente o tempo presente pertence aos homens ocupados, tempo este tão breve que não pode ser alcançado e que é retirado deles já que estão distraídos com muitas coisas.

Há duas modalidades de tempo segundo os modos de vida o experimenta: quem vive, quem se ocupa de si, vive a temporalidade do que acontece, vive o tempo de Aion. O sábio é aquele cujo modo de viver consiste em estar em conformidade com o que acontece. Ele integra o passado ao presente segundo o modo como ordena O maior impedimento para viver a vida é, para Sêneca, a esperança. Na esperança, o futuro não é integrado ao que eu faço. Vivo de expectativas, de esperanças e assim desperdiço a vida, o que é o mesmo que não viver. A vida escrava da multidão experimenta tudo sob o modo da brevidade. Libertar-se da multidão e ocupar-se de si é tornar possível uma existência performática na qual os elementos da finitude não signifiquem carência ou deficiência ontológica.
Se há, como creio, uma espiritualidade estoica, ela consiste em cultivos de modo de si em que nos vemos como artífice e resultado de si. Nem toda forma de uso é da ordem do instrumental, nem todo uso instrumentaliza alguma coisa: por exemplo,  uso uma ferramenta para consertar, para aparafusar, etc. Há usos que integram as coisas ao que sou, ao que faço. A sabedoria estoica levanta-nos, pois, a questão: que uso que nós fazemos de nós mesmos sem que sejamos funcionalizados por algo além de nós mesmos? Usar-se a si mesmo ocupando-se de si é ter uma vida que apareça aos outros como digna de ser cultivada, porque bela, isto é, boa. Ocupar-se de si é meditar; e meditar é elaborar-se.
O cuidado de si é ocupar-se de si, é a vida vivida sob o modo de atenção a si em tudo aquilo que se faz.



Considerações finais

Não estou certo de ter logrado sucesso na busca por tornar claramente exprimível o valor da filosofia. Este texto é destinado ao homem comum que, por preconceito ou preguiça, pensa ser o exercício da filosofia um trabalho como outro qualquer, que se faz com vistas a outra coisa. Espero ter convencido aqueles que pensam ser a prática da filosofia um pôr-se num estado de desocupação com a vida de que estão errados.  As reflexões que elaborei sobre a filosofia estoica visaram, fundamentalmente, a demonstrar que a filosofia é um ato único que deve ser praticado a cada instante, com uma atenção renovada a si mesmo e ao momento presente.
O filósofo está sem cessar perfeitamente consciente não só do que faz (ética vivida), mas também do que pensa (lógica vivida) e do que é, de seu lugar no Cosmos (física vivida). A atenção a si mesmo, segundo os estoicos, o cuidado consigo supõe viver atentamente, sem cessar, na presença da Razão Universal imanente ao Cosmos, vendo todas as coisas na perspectiva dessa Razão e aceitando alegremente o Destino.
O estoico, imerso na totalidade do Cosmo, eleva-se à consciência cósmica. Tudo que existe está destinado à dissolução: assim sou levado a meditar sobre a morte sempre já dada, iminente, como uma lei fundamental da ordem universal. Pensar sobre a morte é pensar sobre a vida.  O pensamento da morte iminente transformará de maneira radical o modo de agir de quem se ocupa de si, fazendo que tome consciência do valor infinito de cada instante. Uma das práticas espirituais mais importantes dos estoicos consistia no “pré-exercício dos males”, isto é, no exercício preparatório para as experiências. Tais exercícios preparatórios visavam à tranquilidade da alma.
E se ainda insistirem em me perguntar “para que serve a filosofia”, a resposta apropriada, fazendo eco a Deleuze, é: a filosofia não serve a ninguém e nem para nada. Mas, se me perguntarem “qual é a importância da filosofia”, então responderei em atenção: liberar o animal humano de sua permanente condição de escravo, de servo, de subserviência, para nele cunhar um modo de ser verdadeiramente livre, ocupado da vida que se lhe destina como gratuidade e que se abrevia a cada vez que a vive sob o modo do desperdício e da ocupação com o mundo do impessoal.

segunda-feira, 10 de setembro de 2018

"O destino conduz o que consente e arrasta o que resiste". (Sêneca)


                       
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                                 O mundo estoico

O estoicismo chama mundo de Natureza ou deus: a natureza é divinizada; e o divino, naturalizado. O divino (theion) é, a rigor, a ordem, a estrutura do universo, o cosmos. A física estoica afirma a total imanência do divino à natureza (natura sive deus). Cosmologia e teologia são, portanto, indissociáveis. É por isso que a felicidade dos homens depende do ajuste de sua vida a esta ordem divina em relação à qual a própria vida humana se ordena e ganha sentido. Os estoicos nos convidam a contemplar ( théion orao ou “eu contemplo o divino”) essa ordem divina do mundo, a conhecê-la como condição necessária para a adesão a esta ordem. Quando bem ajustados estão os homens ao cosmos divino, podem eles desempenhar a função que nele lhes é atribuída, encontrando nele seu lugar próprio para cultivar os talentos que lhes são próprios. Portanto, a vida boa, para um estoico, consiste em adequar-se à ordem divina do mundo, em ficar em harmonia com a harmonia do universo.
É importante dizer que o divino dos estoicos não é transcendente, não se situa num além, não é um deus para quem destinamos preces, orações, mas se confunde com a própria ordem do mundo, ou melhor, é essa ordem, harmoniosa e perfeita, radicalmente superior e exterior aos homens, os quais a descobrem, pelo menos enquanto filósofos, maravilhados. O cosmos se diz divino em virtude dessa sua superioridade radical em relação aos seres que dele fazem parte, mas deus é imanente ao cosmos, ao mundo, à natureza.
O mundo, no estoicismo, se organiza segundo dois princípios indestrutíveis: um princípio passivo (tó páskon), a matéria ou substância sem qualidades; e um princípio ativo (tó poioun), a razão ou o logos, que age sobre a matéria, que é a essência (ousia) ou substância eterna, que só se manifesta na medida em que é informada pelo lógos. Mesmo o princípio jamais aparece desvinculado da matéria, mas só por meio dela. O mundo é composto de indivíduos totalmente diferentes; nele não encontramos jamais dois seres rigorosamente semelhantes. Cada ser é um indivíduo. E todo indivíduo é um corpo, que possui uma tensão interna (tónos), uma maneira de ser. Essa maneira de ser se expressa como estrutura ou coesão (héxis) no mineral; como natureza (phýsis) no vegetal; como alma (psyché) no animal; como espírito (nôus) no homem. Todo ser é uma héxis, uma phýsis, um psyché e o homem ainda se caracteriza por uma quarta maneira de ser que lhe é própria, o nôus.
Para o estoicismo, portanto, no mundo, só há corpos: a alma e o espírito são corpos; o dia e a noite são corpos; deus é um corpo, etc. Os corpos são indivíduos, que se inter-relacionam, que se interprenetram, que se comunicam uns com os outros em relações de simpatia ou antipatia. Mas há também os incorporais, que são quase-seres, que não existem propriamente, mas subsistem como efeitos das relações entre os corpos. Os incorporais têm um mínimo de existência. São incorporais o exprimível, o vazio, o lugar e o tempo.
O logos é um princípio imanente e divino, é inteligência e razão, que tudo ordena. Tudo é rigorosa e profundamente racional. Consoante ensina Reale, “tudo é como a razão quer que seja e como não pode não querer que seja, e o conjunto de todas as coisas é perfeito”[1]. Destarte, os estoicos pensavam a ordem do mundo, em última instância, segundo um finalismo universal. A Providência estoica, que nada tem que ver com a providência de um deus pessoal, é ela mesma esse finalismo universal: trata-se da convicção de que todas as coisas foram feitas pelo logos, segundo uma necessidade e em conformidade com o que é bom. Essa Providência não é transcendente, mas imanente, coincidindo com a alma do mundo, com o próprio mundo. Sob outro ponto de vista, essa Providência imanente e física é pensada como destino (heimarméne), “como necessidade inelutável”.[2]
Para os estoicos, o Destino é a própria natureza, ou “(...) a série irresistível de causas, a ordem natural e necessária de todas as coisas, o indissolúvel nó que liga todos os seres, o lógos segundo o qual as coisas passadas aconteceram, as presentes acontecem e as futuras acontecerão”[3]. Os estoicos concebem o Destino, portanto, como uma realidade natural, inscrita na ordem do mundo ou da vida que anima a totalidade do universo. O destino não é uma força transcendente que governa a vida humana à revelia dos indivíduos. O destino é a ordem e a conexão naturais de todas as coisas, o nexo causal necessário ou, segundo Deleuze, “a unidade das causas entre si (...) na extensão do presente cósmico”[4]. Não há, para um estoico, acaso ou contingência no universo. Tudo é necessário, porquanto o destino é também uma força cósmica e divina, o lógos vital, sopro divino, tensão que organiza e contém o todo. Por isso, o começo da sabedoria humana supõe a tomada de consciência do destino ou da necessidade universal e se desenvolve até realizar-se plenamente na submissão humana ao destino, isto é, no assentimento voluntário à necessidade, à vida que une todos os seres. Eis o que significa viver em conformidade com a natureza.
Sem pretender descer a pormenores sobre a aporia que resulta da admissão conjunta da rígida determinação de todo acontecimento e da admissão da liberdade humana, gostaríamos de dar a saber, em linhas gerais, como os estoicos explicaram a liberdade do sábio. Segundo os estoicos, a liberdade dos sábios consiste em conformar-se com o Destino, mas isso não significa resignação (Deleuze, aliás, nos advertirá disso ao pensar o homem livre como aquele que quer o acontecimento). O viver estoico em conformidade com o Destino ou com a Natureza não é a resignação do homem sofredor que aceita lamentoso seu padecimento. O sábio estoico quer juntamente com o Destino aquilo que o Destino quer. Liberdade aqui é “racional aceitação do destino”[5]. Como o Destino é lógos, uma vez queiramos aquilo que quer o Destino, queremos o que quer o lógos, de modo que “liberdade (...) é levar a vida em total sintonia com o lógos[6] . Sêneca, em Da tranquilidade da alma, diz-nos o que significa o desprendimento do sábio:

Aquele que temer a morte não fará jamais obra de homem, mas aquele que disser a si mesmo que, desde o instante em que foi concebido, sua sorte foi decidida, governará sua vida em conformidade com esta decisão e por prêmio terá a vantagem, graças a este mesmo rigor de alma, de jamais se deixar surpreender por qualquer acontecimento que surja.[7]





REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


COLEÇÃO Os pensadores. Antologia de textos: Epicuro, Lucrécio, Cícero, Sêneca. Trad. Agostinho da Silva et.al. São Paulo: Nova Cultural, 1988.

DELEUZE, Gilles. Lógica do Sentido. São Paulo: Perspectiva, 2015.


REALE, Giovanni. Estoicismo, ceticismo e ecletismo. São Paulo: Edições Loyola, 2011.




[1] Reale, 2011, p. 57.
[2] Ibid., p. 60.
[3] Ibid.
[4] Deleuze, op.cit., p. 5
[5] Reale, op.cit., p. 63.
[6] Ibid.
[7] Sêneca, 1988, p. 207.