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quinta-feira, 24 de maio de 2012

desconectado


                


                 FORA DO AR


Eu insistirei nisto, mesmo que se torne enfadonho: a vida dedicada ao exercício do pensamento reflexivo e à leitura cotidiana causa desgosto, insatisfação e desânimo, no tocante à sociabilidade. Por vezes, tenho vontade de fazer uma limpa nos vínculos virtuais de minha rede social on-line. Para que tantos “amigos”, se compartilho com muito poucos algumas palavras? Felizmente (ou não) é possível deletá-los. Não vê como é incrível isso! Na modernidade líquida, as formas de relacionamentos podem ser facilmente desfeitas e, se forem do tipo “virtuais”, aí podemos simplesmente deletá-los. Deletar é mais fácil do que romper com relacionamentos convencionais, que envolvem corpos, olhares, toques, feições. No caso desses, a ruptura pode, muita vez, nos causar certo desconforto ou aborrecimento. Mas, nos relacionamentos virtuais, o desligamento não nos acarreta qualquer enfado. Não raro, pessoas há que esquecem donde proveio a última pessoa que a adicionou. Há muitas pessoas em minha página com quem sequer troco meia palavra. Sinceramente, não vejo muito sentido em conservar imagens de fotos digitais ou impressões verbais, se eu não tenho qualquer relação substancial com as pessoas por trás desses registros. Tudo isso é consequência de uma doença coletiva, de fundo psíquico, que consiste no medo de conviver com a solidão. A ilusão de ter, digamos, 150 “amigos” em nossa página numa rede de relacionamentos virtuais, parece bastar para que fiquemos seguros de que não engrossamos a lista imensa dos solitários da sociedade individualista, que sustenta a ideologia do “egoísmo amoroso” (“ame a si mesmo em primeiro lugar”, expressão do rancor de pessoas profundamente carentes de vínculos sólidos, de amores sinceros, de pessoas que não se dão conta de que produzem os dizeres que reproduzem a liquidez dos vínculos humanos nessa fase líquida de nossa modernidade).

É certo que não posso esperar nada mais do que a mesmice nesses contextos virtuais de relacionamentos. Confesso que já pensei em me deletar. Gosto desta palavra. Ela facilita nossos embaraços sociais. Nas redes sociais de relacionamentos on-line, decerto quantidade não é qualidade. Continuo ainda buscando a minha "turma". Mas preciso encontrá-la aqui na vida real, onde há corpos e calor humano. Onde há contato entre olhares e gestos encarnados.

“Diferentemente dos “relacionamentos reais”, é fácil entrar e sair dos “relacionamentos virtuais”. Em comparação com a “coisa autêntica”, pesada, lenta e confusa, eles parecem inteligentes e limpos, fáceis de usar, compreender e manusear”

(BAUMAN, Amor Líquido, p. 13)


Felizmente, conheci pessoas por quem ainda vale a pena manter-me conectado e que, um dia, espero conhecer presencialmente. Mas não custa lembrar novamente as palavras de Bauman:


“(...) as relações virtuais (rebatizadas de “conexões”) estabelecem o padrão que orienta todos os outros relacionamentos. Isso não traz felicidade aos homens e mulheres que se rendem a essa pressão, dificilmente se poderia imaginá-los mais felizes agora do que quando se envolviam nas relações pré-virtuais. Ganha-se de um lado, perde-se de outro”.


                                                           (p. 13)